Depois de quatro dias de debates em Brasília, encerrou-se no último dia 25 o Seminário Nacional de Ordenamento da Pesca Artesanal, com a formulação de um documento final contendo diretrizes e propostas para o sistema de gestão pesqueira do Brasil.
Ao reunir agentes de diferentes regiões do país e vindos de variados contexto - pescadores/as, acadêmicos/as, representantes do governo e de organizações não governamentais - o Seminário refletiu sobre a atual situação do sistema de ordenamento brasileiro, que desconsidera os saberes tradicionais e não possui o investimento devido para acontecer de maneira participativa. “A convenção 169 precisa ser respeitada por garantir o protagonismo dos grupos historicamente oprimidos, o governo não pode mais desrespeitar a convenção”, denuncia a Procuradora do Ministério Público Federal, Deborah Duprat.
As dificuldades são observadas já em relação às estatísticas necessárias, “a ausência de uma estatística pesqueira é um problema e a histórica descontinuidade e constante mudança do setor que se responsabiliza pela pesca é um dos fatores. Precisamos dar a devida importância econômica e social deste setor”, explica o agente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Lima Green.
A invisibilidade das mulheres pescadoras também teve atenção durante as reflexões, “não tem como se pensar um sistema de ordenamento sem fazer o recorte de gênero”, comentou a agente do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Laurineide Santana. O governo entra na contramão desse debate negando à mulher o direito a se identificar como pescadora. “O decreto 8425 cria subcategorias e chama a pescadora de trabalhadora de apoio à pesca, e assim não pode acontecer”, continua Laurineide refletindo a opinião das pescadoras presentes no Seminário.
Além de considerar o trabalho das mulheres, o coletivo levantou que também é preciso reconhecer e proteger os territórios tradicionais dos pescadores e das pescadoras. “A construção do Sistema de Ordenamento só pode ser possível se as comunidades pesqueiras tiverem seus territórios protegidos, pois o avanço do modelo desenvolvimentista está acabando com esses espaços, e sem área pesqueira, como faremos o ordenamento?”, comenta o pescador mineiro, Josemar Durães.
Já nos encaminhamentos, o coletivo foi dividido em grupos, a partir dos diversos ecossistemas encontrados no território brasileiro e por regiões, no intuito de serem discutidas estratégias e diretrizes para o sistema nacional de ordenamento.
A junção dos diagnósticos do atual sistema de ordenamento da pesca artesanal e das diretrizes e estratégias pensadas coletivamente criou um documento final do Seminário que será encaminhado às instâncias do governo responsáveis por essa gestão.
Pontos como a fiscalização mais forte sobre os impactos das grandes obras nos territórios pesqueiros assim como o reconhecimento da tradicionalidade dessas áreas, a construção de mecanismos e políticas participativos baseadas na convenção 169 e nas diretrizes da FAO para a pesca de pequena escala e artesanal, a criação de políticas que garantam a autonomia das mulheres pescadoras e a implementação de programas de Estado aparecem junto a outras estratégias que merecem atenção e efetivações por parte do governo.
O seminário terminou com a aprovação desse documento final e pescadores e pescadoras saíram com grande expectativa de que o governo considere em suas decisões as diretrizes construídas. “Espero que o governo faça valer nossos direitos, e que deixe a gente trabalhar”, expressa a pescadora do Ceará, Maria Eliene (Maninha).
Fonte: MPP
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