terça-feira, 6 de setembro de 2011

Baleia corcunda (jubarte) inspira biólogos portugueses a inventar forma de pesca


Vendo no YouTube o vídeo sobre a forma como pescam as baleias-corcundas, dá para perceber por que é que Cláudia Correia, Tiago Almeida e Mariana Duarte tiveram o "clique". O momento eureka dos jovens biólogos aconteceu em 2007, a ver televisão. Na altura, ainda eram finalistas de Biologia Marinha e Biotecnologia na Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM) em Peniche, e tinham de apresentar um projecto de final de curso na vertente aquacultura e pescas.

"Umas das questões que sempre abordámos no curso foram os problemas da pesca. Todos os tipos de pesca têm os seus problemas. Por que não corrigi-los?", conta Tiago Almeida, de 27 anos, que faz questão de dizer que é de Oliveira do Hospital. Uma noite sentaram-se em frente à televisão. "Era daqueles dias em que não estava a dar nada nos quatro canais e, de repente, ficámos a ver um documentário sobre as baleias-corcundas e a sua estratégia alimentar", recorda Cláudia Correia, de 29 anos.

Esta espécie (Megoptera novaenaglis) forma um círculo com bolhas para aprisionar e capturar o peixe - a estratégia chama-se bubble net feeding. Fez-se luz. "É uma rede de bolhas inofensiva para as espécies e natural. Porque não adaptá-la às artes de pesca?", pensaram. A técnica é semelhante à que é utilizada no cerco tradicional, uma das artes mais utilizadas em Portugal (sobretudo na captura de sardinha), em que a rede é colocada à volta do cardume. Em vez da rede, usariam bolhas de ar.

Apresentaram a ideia ao professor João Correia, biólogo marinho, que conduzia a cadeira de projecto. A reacção foi efusiva: "Eh, pá, grande ideia!". Nasceu a Bubble Net.

Cláudia Correia e Tiago Almeida queriam que tudo fosse mais rápido. A ideia surgiu em 2007. Um ano depois, deu-se início ao processo de registo internacional encabeçado pelo Instituto Politécnico de Leiria, a que pertence a ESTM. Seguiu-se a busca de financiamento. "O projecto agradou às capitais de risco, mas todas exigiram provas concretas. E nós precisávamos de dinheiro para conceber o protótipo e comprovar a ideia. Sem dinheiro, não há investigação", lembra Cláudia. Tiago lamenta: "o risco da capital de risco em Portugal é muito calculado".

Uma candidatura ao Programa Operacional de Pesca (Promar) foi, por isso, essencial para avançarem. Em Agosto de 2010 conseguiram apoios no valor de 540 mil euros para construir o protótipo à escala real. Já este ano puderam finalmente pôr mãos à obra e estão a comprar o material necessário para avançar com o projecto. Seguem-se as fases de experimentação no mar, que deverão arrancar dentro de um ano.

Entretanto, recorreram ao crowdfunding (financiamento online) para criar uma empresa e transformar a invenção científica num produto comercializável no mercado global. "Ainda não temos plano de negócios, mas a empresa pertencerá aos três investigadores e a intenção é explorar comercialmente o produto, cuja patente é detida pelo Instituto Politécnico de Leiria. Queremos pegar na ideia e trazê-la para o mercado", diz Tiago. Peru, Chile, Japão, China são alguns dos países potencialmente interessados. "Toda a linha equatorial costeira é potencial cliente", refere Cláudia.

Na plataforma PPL, a Bubble Net tinha angariado até sexta-feira 90 euros, dados por cinco apoiantes. Restam 79 dias para conseguirem obter os oito mil euros necessários para custos com advogados, divulgação, contabilidade e despesas administrativas. O montante servirá para manter a empresa a funcionar durante um ano. "O crowdfunding permite-nos manter a independência", explica Tiago.

Cláudia revela que, para a constituição da empresa, já apareceram muitos investidores interessados, mas os empreendedores preferem ver como corre a angariação de fundos na Internet. "Fomos aprendendo com o tempo que quando as necessidades de capital são baixas é preferível tentar angariar fundos de outra forma. Mais vale recorrer a investidores quando avançarmos para a internacionalização da Bubble Net, algo que vai requerer montantes elevados de investimento", adianta Tiago.

Para além do financiamento, os jovens biólogos têm outro desafio pela frente. A ideia da Bubble Net esbarra em "resistências culturais": o equipamento implica uma nova forma de pescar, a pensar na sustentabilidade e na preservação ambiental. Na prática, a bubble net é largada no mar pela embarcação mais pequena (chata) que tradicionalmente acompanha o barco na pesca de cerco. Uma espécie de mangueira rodeia o cardume. Depois, liga-se uma corrente de ar que forma uma parede de bolhas, criando a tal barreira que impede a fuga de peixe. "É mais difícil implementar o projecto em Portugal", onde as artes tradicionais de pesca têm peso, admitem os empreendedores.

Mas Tiago, Cláudia e Mariana (de 26 anos) acreditam na ideia, que nasceu um dia à noite depois de verem o documentário das baleias-corcundas. "É um processo muito rápido e inofensivo para o peixe, não implica redes", diz Tiago. O pescador poupa em combustível, na aquisição da rede (que chega a custar 150 mil euros) e na sua reparação. Por outro lado, "acabando com a rede no cerco, acabam-se as redes-fantasmas que ficam à deriva no mar, que capturam e arrastam os peixes", acrescenta Cláudia. É possível prevenir a extinção de espécies com métodos de pesca que satisfaçam as necessidades dos pescadores, garantem

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